O valor da integridade territorial dos estados europeus é como as taxas de juro das dívidas soberanas: sobe e desce sem ninguém conseguir explicar porquê. Quando o valor estava em baixa, a NATO bombardeou a Sérvia, ocupou o Kosovo e, em 2008, declarou a independência de um Estado falhado cuja existência nenhuma pessoa séria consegue justificar. Quando o valor voltou a estar em alta, a Crimeia, russa de pai e mãe, é parte intocável da Ucrânia. Mesmo que tenha sido arrancada à Rússia há apenas 60 anos e oferecida à Ucrânia, como se de um presente se tratasse, por Nikita Krustchov, em celebração do terceiro centenário da unificação dos dois países. Mesmo que a sua reintegração na Rússia tenha sido aprovada por unanimidade pelo parlamento eleito da Crimeia e vá ser sujeita a referendo ainda este mês. Na realidade, os russos estão a conseguir o improvável: embrulhar o ocidente na sua própria retórica democrática.
Daniel Oliveira, semanário Expresso