Há quanto tempo não caminhamos assobiando, ou não seguimos com um fio de erva nos lábios, sem mais, sem pressas nem pretensões, acreditando simplesmente no valor de ser e que, por isso, nos dão a possibilidade de estar, de vaguear, de medir o momento apenas com o peso e a leveza da própria marcha? Quando vamos de um lado para o outro estamos, normalmente, presos aos motivos que justificam a deslocação. Mas – temos de reconhecê-lo – uma viagem assim é demasiado curta. E não é isso primaverar. Há uma outra viagem que só começa quando as perguntas sobre o que fazemos ali deixam de interessar. Estamos, ponto final. Viemos. Não é o saber ou a utilidade que a definem, mas o próprio ser, a expressão profunda de si. A sabedoria dos que primaveram não consiste, assim, num conhecimento prévio, mas em alguma coisa que se descobre na habitação do próprio caminho.
José Tolentino Mendonça, revista