Eu escrevo todos os dias, mas não sei descrever a minha paixão por Palmira [na Síria]. […] Palmira é tanto mais que Roma. É subir ao castelo para o pôr do Sol e ver uma cidade inteira no deserto e conseguir imaginar quando Zenobia [antiga rainha] ousava. É a roupa que os habitantes da cidade moderna estendem nas colunas. Os miúdos de mota entre as ruínas. Palmira é indescritível, inexplicável e minha. […] Os lugares são as pessoas e as pessoas têm dentro de si os lugares onde cresceram ou de onde se sentem. […] Tenho muito mundo e falta-me muito mais do aquele que tenho. Tenho tanto, e tanto do que tenho está a desaparecer. Pessoas e cidades, ruínas e pessoas. Lugares que deveriam durar mais do que as pessoas. Porque já lá estavam antes e deviam continuar, para lá voltarmos com os filhos que vamos ter, para que os filhos deles se possam deixar encantar como eu pude. Choro ruínas que agora são destroços como choro pessoas que desaparecem todos os dias. No Iémen, no Iraque, na Síria. As pessoas que lá nasceram também choram as ruas que nunca mais vão percorrer ou as ruínas que não voltaram a contemplar.
Sofia Lorena, jornal Público